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terça-feira, maio 06, 2008

Lusco-fusco na mata

Ao pôr do sol, miríades de pássaros esvoaçavam, pipiando, piando, chamando, tristes uns, alegres outros, saudosos outros, numa atoarda sem fim nem harmonia; variavam em cor, em tamanho, em cantorias.

Assim como, em oferta policrômica de extasiar, se apresentavam as borboletas, ligeiras umas, pesadas outras, leves e diáfanas ainda outras, tudo numa promiscuidade de sonho, de luzes e sombras, de despedida e languor, como se aquela fosse a última tarde do mundo, o derradeiro respiro de todas as vidas, o máximo anseio da fauna em geral.

Animais bravios de quando em quando uivavam ao longe, enquanto preás e outros roedores, como se fossem projéteis vivos, ziguezagueavam de um lado para outro, esgueirando-se alguns pelas frestas da pedraria, a olhar com olhares assustadiços e travessos, para fazerem das ervinhas tenras o manjar apetitoso, ervinhas que nasciam por entre os sulcos da rocha, bem ao rés da montanha, onde o aguaceiro se desfazia em espumarada nos bordos da correnteza.

Por entre touceiras espiavam coelhos do mato, e ouriços pardos e feios também vinham apreciar a festa da bicharada, em despedida do dia.

O crepúsculo vinha se acentuando, e enquanto o passaredo ia caindo em silêncio, os animais da noite vinham de tomar a dianteira nos ruídos em geral. Era quando a quietude inundava por um pouco o ambiente pujante da selva virgem.
Lusco-fusco - momento de transição entre o dia e a noite e entre a noite e o dia, ou seja o crepúsculo vespertino e o crepúsculo matutino. Meia claridade. Derivado de dois adjetivos latinos: luscus = que vê só de um olho, vesgo, que enxerga mal. + fuscus = fosco, escuro, pardo, gado de cor esfumaçada.
(do livro: O médium de transporte - Osvaldo Polidoro)

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