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quinta-feira, abril 23, 2009

Restares

O grande poeta Vinícius de Moraes teve a capacidade de mostrar os segredos d'alma, aqueles que escondem-se sob a superfície calma do lago que lutamos em ser.

Emoções e sensações são diferentes de sentimentos e todos eles estão enclausurados pela fina camada da conveniência social.

Às vezes eles explodem, feito lava jorrada às alturas e aí, a loucura humana é o rótulo para classificar aqueles que não aguentaram a pressão interna das dores.

Trechos abaixo, pincelados pelo meu gosto, numa decomposição poética do poema "O HAVER" retratam o que resta nos sentimentos que são mal tratados.
(...)
Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será e virá a ser
E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante.

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.

Poema inteiro : O HAVER

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